4. Seminário (05/10) – Júlia Milaré – Extremidades: poética Shanzai em “if you’re lucky (bad copy lost in translation)” (de Júlia Milaré, Brasil, 2023)

Artigo para a ANIKI – Revista Portuguesa da Imagem em Movimento (publicada pela AIM –
Associação de Investigadores da Imagem em Movimento com apoio do IHC – Instituto de
História Contemporânea – FCSH-UNL)

Autoras: Júlia Milaré e Christine Mello;

Programa de Mestrado em Comunicação e Semiótica da Pontifícia Universidade Católica de São
Paulo, na área de concentração: Signo e Significado nos Processo Comunicacionais, sob
orientação de Christine Mello

RESUMO: Este artigo propõe uma reflexão sobre os modos de existência da imagem na contemporaneidade a partir do tensionamento entre a linguagem pictórica e os dispositivos digitais de produção e circulação. Por meio da articulação entre três eixos conceituais, a filosofia shanzhai (HAN, 2022), a abordagem das extremidades (MELLO, 2008) e a noção de imagem performativa (BAIO, 2023), o texto investiga como a pintura pode atuar como superfície crítica em meio aos fluxos algorítmicos, à lógica da cópia e aos regimes de visibilidade acelerada. A pesquisa mobiliza a ideia de montagem como procedimento e de contaminação como metodologia, compreendendo a imagem não como representação estática, mas como acontecimento técnico, relacional e político. Com isso, propõe-se repensar o lugar da pintura em um campo expandido da imagem, no qual autoria, originalidade e aura são constantemente deslocadas.


Palavras-chave: Imagem, pictórica, digital, Performatividade, extremidades, shanzhai.


ABSTRACT: This article presents a reflection on the modes of existence of the image in contemporary culture, focusing on the tensions between pictorial language and digital devices of production and circulation. Through the articulation of three conceptual frameworks – the philosophy of shanzhai (HAN, 2022), the approach of extremities (MELLO, 2008), and the notion of the image as performative (BAIO, 2023) – , the text explores how painting can operate as a critical surface within algorithmic flows, the logic of copying, and accelerated regimes of visibility. The research mobilizes montage as a procedure and contamination as a method, approaching the image not as static representation, but as a technical, relational, and political event. The article proposes a reconfiguration of painting’s role within the expanded field of the image, in which authorship, originality, and aura are continuously displaced.

Keywords: Image, pictorial, digital, performativity, extremities, shanzhai.

INTRODUÇÃO
Vivemos imersos em um mundo saturado por imagens que se multiplicam, circulam e se transformam em velocidade vertiginosa. As tecnologias digitais e os dispositivos de captura, edição e compartilhamento operam como aceleradores da produção visual contemporânea, instaurando um regime em que a imagem já não remete apenas à representação, mas ao fluxo, ao consumo e à performatividade. Nesse contexto, a pintura — linguagem associada à lentidão, ao gesto manual e à singularidade — pode parecer anacrônica. No entanto, é justamente nesse aparente deslocamento que ela reaparece como questão. Como a pintura pode reagir à lógica da repetição, da cópia, da circulação massiva de imagens? Como pode se posicionar frente aos valores kitsch, à estetização exacerbada, à cultura do excesso e da simulação?

É a partir dessas questões que se organiza a análise deste artigo, centrada na obra If you’re lucky (bad copy lost in translation, 2023), de Júlia Milaré, concebida a partir de uma experiência de residência artística no bairro de Dafen, em Shenzhen, na China. Internacionalmente conhecido como “Oil Painting Village”, Dafen concentra centenas de ateliês dedicados à reprodução de pinturas a óleo de modo seriado, operando em larga escala com base na repetição, na variação e na destituição da ideia de originalidade como valor central. Ao imergir nesse contexto, a artista não apenas observa um sistema de produção de imagens fundado na cópia, mas também se implica nele, formulando uma proposição que tensiona os limites entre o pictórico e o digital, entre o gesto manual e o algoritmo, entre a autoria e a multiplicação.

A obra instala-se nesse território ambíguo entre tradição e tecnicidade, ativando camadas de linguagem que operam deslocamentos significativos na maneira como a imagem é concebida, reproduzida e compartilhada na contemporaneidade. Pinturas manuais e imagens produzidas por inteligência artificial se sobrepõem em suportes ordinários, como etiquetas adesivas (stickers), e circulam em um sistema de sorteio, que confere ao público a experiência da escolha e do acaso como parte constitutiva da obra. O conjunto cria uma operação crítica em que a pintura deixa de ser apenas objeto contemplativo ou gesto autoral singular para se tornar vetor de contaminações, camadas, reencenações e trocas simbólicas.

O problema central que se impõe é a própria condição da cópia na contemporaneidade: em um
mundo saturado de imagens, qual o estatuto da repetição? O que a cópia revela quando é assumida como procedimento, e não como fraude? A vivência em Dafen permite entrever a cópia não como um ruído da criação, mas como um campo fértil de repetição divergente, em que os gestos da mão, os desvios do traço e os excessos de materialidade — aquilo que, em outra chave, se poderia chamar de “rebarba”, no sentido de falha e defeito/efeito — assumem papel ativo na constituição do sentido. A proposta aqui desenvolvida é, portanto, discutir como a linguagem pictórica — com sua densidade técnica, temporal e sensível — pode reagir, tensionar e até mesmo incorporar as transformações trazidas pela inteligência artificial, pela lógica algorítmica e pelos dispositivos de circulação digital. A pesquisa aposta na hipótese de que a pintura, longe de estar obsoleta, pode operar como zona de fricção crítica frente à fluidez da imagem digital.


Nesse cenário, o que está em jogo é o próprio tensionamento entre a imagem pictórica e a imagem digital. Longe de se oporem, essas categorias se sobrepõem e se reconfiguram em um procedimento que poderíamos chamar de “tela sobre tela”. O gesto de pintar uma imagem observada em uma tela digital, transformá-la em sticker (tomado como suporte alternativo ao canvas tradicional), digitalizá-la novamente e distribuí-la em rede constitui um circuito híbrido, no qual o suporte deixa de ser fixo e se torna campo de transição. Essa operação revela não apenas a fluidez dos meios, mas também o deslocamento das relações entre presença, representação e gesto.


Essa discussão articula três operadores teóricos: a Abordagem das Extremidades, proposta por
Christine Mello (2008), que compreende o campo da arte a partir de intersecções entre linguagens, tecnologias, circuitos de produção e formas de ativação estética e política; a noção de imagem performativa, formulada por César Baio (2023), que desloca a imagem de seu estatuto representacional e a reinscreve como acontecimento técnico e relacional; e a filosofia shanzhai, explorada por Byung-Chul Han (2010), que opera uma crítica às noções ocidentais de originalidade e autenticidade ao valorizar a cópia como forma de reinvenção e desvio.

O primeiro, a abordagem das extremidades, formulada por Christine Mello, co-autora deste artigo, que se constitui como um instrumental de leitura crítica voltado à observação de práticas artísticas e midiáticas a partir de zonas limítrofes. A abordagem das extremidades valoriza os procedimentos de desconstrução, contaminação e compartilhamento, convocando o leitor a se posicionar fora dos centros hegemônicos e a observar os objetos em análise a partir de suas bordas, de seus ruídos, falhas, e suas rebarbas. Esse deslocamento permite ler a obra de Milaré não apenas como uma peça sobre a cópia, mas como um artefato que habita simultaneamente diferentes mundos: culturais, tecnológicos e simbólicos.


O segundo operador teórico é o conceito de imagem performativa, elaborado por César Baio, que oferece um caminho para pensar a imagem não mais como representação, mas como fenômeno em presença. A performatividade da imagem, nesse sentido, diz respeito ao seu comportamento no espaço, à maneira como ela se relaciona com o corpo do observador, ao modo como interpela, responde, coexiste. Essa concepção desloca o foco da análise da imagem para o “encontro entre imagem e sujeito”, compreendendo esse encontro como um gesto, como um ato simbólico que mobiliza o corpo, a percepção e o pensamento. Ao ser distribuída aleatoriamente ao público, ao provocar reações afetivas e estéticas não previstas, a obra de Milaré aciona justamente esse tipo de regime de sentido, no qual a imagem não representa, mas age, performa.

No contexto da pesquisa, o pensamento shanzhai não é abordado apenas como tema, mas como estrutura filosófica de pensamento que contamina o próprio modo de produzir e refletir sobre a imagem. Ao aceitar a imperfeição, a variação e o deslocamento como valores positivos, o shanzhai aproxima-se da ideia de imagem como processo contínuo de recombinação e atualização, tal como propõe Baio, e também da lógica das extremidades, em que as obras se realizam nas bordas, nos atravessamentos e nas zonas de instabilidade entre campos. A pintura, nesse cenário, torna-se o lugar por onde essas forças se encontram: onde a cópia deixa de ser falta, o erro se converte em operação estética, e a imagem se monta como gesto relacional, contaminado e distribuído. A filosofia shanzhai analisada , incorporada como referência tangencial neste estudo, fornece subsídios para pensar essas operações a partir de um ponto de vista não ocidental, no qual a imitação não é necessariamente um sinal de submissão, mas uma
forma de reinvenção estratégica da forma e da linguagem.

O percurso deste artigo será dividido em três momentos principais. O primeiro apresenta a obra If you’re lucky (bad copy lost in translation) em seu contexto de produção, detalhando os materiais, os procedimentos e os dispositivos ativados pela artista, com atenção especial à experiência de Dafen e à lógica da sobreposição de superfícies — a “tela sobre tela” que nomeia o artigo. O segundo momento analisa a obra por meio da abordagem das extremidades, destacando os modos como ela desconstrói categorias fixas, contamina linguagens e compartilha espaços e sentidos. O terceiro momento articula a noção de imagem performativa para compreender os efeitos sensíveis e simbólicos da obra em seu contato com o público, com ênfase na presença, no gesto e na alteridade da imagem.


Ao articular esses eixos, as extremidades e a performatividade e o shanzhai (como uma espécie de pensamento que alinhava as questões por trás da produção e experiência de If you’re lucky (bad copy lost in translation) e os operadores teóricos), o artigo busca contribuir para o debate contemporâneo sobre os modos de existência da imagem em tempos de saturação técnica, circulação massiva e colapso da ideia de originalidade. Trata-se de pensar a imagem como um campo de operações instáveis, em que o pictórico e o digital não se excluem, mas se implicam mutuamente, abrindo fissuras por onde novas éticas e estéticas podem emergir.

  1. TELAS SOBRE TELAS: apresentação da obra If you’re lucky (bad copy lost in
    translation), o bairro das cópias (Dafen) e o pensamento shanzhai.

O bairro de Dafen, localizado na cidade de Shenzhen, na China, tornou-se internacionalmente conhecido como um polo de reprodução de pinturas a óleo. Desde os anos 1990, o local consolidou-se como epicentro de uma economia simbólica baseada na cópia: milhares de imagens são ali pintadas por encomenda, com precisão técnica e alto grau de repetição. A produção responde à demanda internacional por imagens decorativas e versões acessíveis de obras canônicas da história da arte. No entanto, mais do que um espaço fabril, Dafen é também um território cultural que expõe os deslocamentos de valor e os atravessamentos simbólicos que cercam a noção de originalidade.

A obra If you’re lucky (bad copy lost in translation), de Júlia Milaré, emerge da experiência da artista nesse ambiente e se propõe a ativar criticamente suas tensões. Para isso, ela articula procedimentos manuais e digitais, trabalhando com imagens produzidas por dois meios distintos (a pintura à mão e a geração algorítmica por inteligência artificial, posteriormente transpostas para etiquetas adesivas, stickers) que são distribuídas por sorteio ao público. Trata-se de uma operação que tensiona simultaneamente as fronteiras entre autoria e reprodução, gesto e automatismo, arte e circulação.

Imagem 3. Público no espaço TNT Contemporary Art, em Dafen, Shanzhen, China, após sortearem as imagens do trabalho “Ifyou’re lucky (bad copy lost in translation), 2023 de Júlia Milaré. Imagens fornecidas do arquivo da artista.

Ao situar-se em Dafen e assumir a cópia como ponto de partida, a obra não se posiciona como denúncia nem como exotização da prática local, mas propõe um deslocamento epistemológico. A cópia, aqui, não é entendida como falha moral ou degradação da imagem, mas como prática cultural situada, relacionada ao pensamento shanzhai. Esse conceito, amplamente discutido por autores como Byung-Chul Han, descreve uma lógica própria da tradição chinesa em que a imitação não é necessariamente um desvio, mas um caminho para a diferenciação. No shanzhai, a cópia não pretende substituir o original: ela o transforma, o desloca, o atualiza. Essa filosofia implica uma crítica às noções ocidentais de propriedade intelectual e valor de autenticidade, propondo que toda repetição carrega consigo uma variação inevitável, e talvez produtiva.

Imagem 4. Detalhes da obra “If you’re lucky (bad copy lost in translation), 2023 de Júlia Milaré. Imagens fornecidas do arquivo da artista.

Imagem 5. Detalhes dos adesivos pintados da obra “If you’re lucky (bad copy lost in translation), 2023 de Júlia Milaré. Imagens fornecidas do arquivo da artista.

Imagem 6. Detalhes dos adesivo com imagens criadas a partir da IA, impressões digitais, da obra “If you’re lucky (bad copy lost in translation), 2023 de Júlia Milaré. Imagens fornecidas do arquivo da artista.

O próprio processo produtivo da obra revela esse embate. Ao empregar a pintura manual para replicar uma imagem de origem digital, a artista opera dentro do mesmo regime repetitivo que observou nos ateliês de Dafen. Entretanto, essa repetição é atravessada por desvios, imperfeições, pequenas falhas de gesto, aquilo que poderíamos nomear como “rebarba”. A rebarba, nesse contexto, adquire valor poético e conceitual: é a diferença que insiste, o erro que escapa ao controle, a deformação que revela o tempo do corpo na imagem.

Por outro lado, o uso da inteligência artificial para gerar variações da mesma imagem a partir de descrições em linguagem natural também evoca essa lógica. As imagens produzidas pelas plataformas de IA, ainda que automatizadas, não são cópias idênticas. Elas revelam seus próprios ruídos: olhos borrados, proporções instáveis, interpretações literais ou excessivamente sintéticas do texto original. Nesse sentido, as falhas algorítmicas dialogam com as falhas humanas, colocando em paralelo a rebarba do gesto e a rebarba do código.

O título da obra If you’re lucky (bad copy lost in translation), reforça essas operações. A primeira parte sugere a lógica do acaso, que organiza a ativação da obra por meio do sorteio. Já “bad copy” e “lost in translation” apontam para os deslizamentos de sentido que atravessam as imagens ao longo do processo: do digital ao pictórico, da mão à máquina, da linguagem visual à textual e de volta. A tradução, nesse contexto, é também uma traição — não como falha, mas como revelação de uma zona de instabilidade.

Formalmente, a obra é composta por uma série de stickers (etiquetas adesivas de 5,5 x 3,5 cm) com imagens impressas ou pintadas, uma caixa de sorteio customizada (20 x 20 x 20 cm), um objeto de acrílico pintado com tinta acrílica, e uma imagem ampliada impressa em papel (42 x 29,7 cm). As 400 unidades de stickers foram assinadas e numeradas, mas não distribuídas por escolha estética, e sim por sorteio. Essa estratégia retira do público a capacidade de avaliar ou hierarquizar as imagens, instaurando uma relação marcada pela surpresa, pelo desencaixe entre expectativa e resultado. O público “ganha” uma imagem, mas não pode controlá-la: esse gesto evoca tanto o humor do título quanto a crítica à lógica de desejo e valor das imagens na contemporaneidade.


Além de seus aspectos materiais e procedimentais, a obra é também atravessada por camadas de experiência subjetiva da artista durante sua estadia em Dafen. O contato com os pintores locais, as negociações linguísticas precárias e as mediações culturais marcaram o processo. A artista, estrangeira, branca, ocidental e não fluente em mandarim, inseriu-se em um contexto social e político radicalmente distinto do seu. Esse deslocamento não apenas compôs o conteúdo da obra, mas transformou sua forma: cada decisão material foi atravessada por restrições, por mal-entendidos, por aprendizados imprevistos.


Esses episódios de negociação, estranhamento e tradução direta entre culturas — muitas vezes marcados por lapsos e incompreensões — reforçam o próprio título da obra: algo se perde na tradução, algo falha no percurso, e é justamente nesse espaço entre o controle e o acaso que a obra se inscreve. Ao invés de recusar esse ruído, a obra o transforma em método. O “perdido” se torna produtivo; a “má cópia” é aquela que revela o sistema; o sticker, suporte cotidiano e descartável, torna-se veículo de crítica sensível e deslocamento da pintura.

Dessa forma, If you’re lucky (bad copy lost in translation) pode ser compreendida como um artefato que encarna a filosofia shanzhai em sua potência crítica, articulando gesto pictórico, automatismo digital e operação conceitual em uma mesma superfície. É justamente pela sobreposição de linguagens que a obra convoca o pensamento sobre a imagem em trânsito: tela digital, tela de pintura, tela de compartilhamento. A “tela sobre tela” não é apenas uma operação formal, mas uma metáfora expandida da condição da imagem contemporânea: instável, contaminada, frágil, operando entre falhas e excessos, e demandando modos outros de leitura.

Um aspecto que também se insinua na obra If you’re lucky (bad copy lost in translation) diz respeito ao seu trânsito deliberado por formas visuais associadas ao kitsch. Os stickers, a caixa adesivada, a repetição da imagem com pequenas falhas ou exageros de cor, e a referência velada à sorte (tão presente em biscoitos, amuletos e brindes gráficos de baixa materialidade) operam dentro de uma estética que Domenico Quaranta descreve como “kitsch digital”. Para o autor, o kitsch contemporâneo não apenas continua a existir na cultura digital, ele se reconfigura nas linguagens da computação gráfica, dos filtros, da nostalgia das imagens JPEG e do acúmulo visual típico das plataformas. Nesse ambiente, afirma Quaranta, o kitsch não representa apenas “mau gosto”, mas uma recusa às pretensões puristas da arte contemporânea.


No contexto da obra de Milaré, o kitsch digital não é apenas um estilo: ele se apresenta como uma zona de ruído crítica, um espaço estético em que as imagens repetidas, deformadas e descartáveis retornam com carga simbólica renovada. A banalidade do sticker adesivo (objeto vendido em papelarias, brinde comum de culturas pop e juvenis) é reconfigurada como suporte da pintura. Essa inversão desloca a expectativa do espectador e ironiza o lugar da obra no sistema de arte, sobretudo em sua relação com o valor. O sticker pintado e numerado é, simultaneamente, item de coleção e objeto de sorteio; é ao mesmo tempo arte e produto gráfico. Esse deslizamento entre alta e baixa cultura, central ao conceito de kitsch, é exacerbado aqui pela lógica do sorteio: o valor simbólico da imagem não está em seu conteúdo, mas no acaso do encontro.


Como observa Quaranta, o kitsch digital não se opõe à técnica, mas a usa até o limite da saturação. No caso da obra de Milaré, a imagem gerada por IA também participa dessa lógica, imagens que prometem perfeição técnica, mas entregam distorções bizarras e imperfeições visuais que evocam tanto o erro quanto o excesso. Assim como no kitsch, o valor emocional ou afetivo supera o rigor formal. A presença desses elementos pode ser lida como um convite ao pensamento sobre a imagem em tempos de consumo massivo, de dissolução do valor simbólico pela repetição, e de estetização de tudo, inclusive do erro.

  1. REBARBAS, FISSURAS e FALHAS ENTRE TELAS: leitura da obra pela
    abordagem das extremidades

A abordagem das extremidades, formulada por Christine Mello, propõe um deslocamento do centro observacional para as zonas limítrofes da experiência estética e social. Em vez de buscar a estabilidade dos signos, essa abordagem se interessa por suas fraturas, seus excessos, seus atravessamentos e falhas — elementos que, longe de serem ruídos negativos, se tornam matéria crítica. Sua potência reside na leitura de trabalhos que operam “em trânsito, limítrofes e instáveis”, abrindo espaço para experimentações que tensionam os limites entre linguagens, suportes, mundos e regimes de visibilidade. Essa leitura crítica exige atenção a três procedimentos centrais: desconstrução, contaminação e compartilhamento. Tais operadores não se referem apenas à obra em si, mas também à forma como ela se instala no mundo, nas redes, nos corpos e na sensibilidade.


No início do capítulo 1 do livro “Extremidades do vídeo” (2008), Mello traz a ideia de falha para amparar sua visão sobre os estudos da arte do vídeo: “Nos estudos da geologia, o termo falha denomina o deslocamento existente entre uma rocha e outra: nos estudos da arte do vídeo encontramos certas falhas, fissuras ou fendas produzidas como formas de transformação da sua linguagem” (Mello, 2028: 25). É no mesmo caminho de Mello que o pensamento por trás da obra “If you’re lucky (bad copy lost in translation) de Milaré quando encontra na filosofia shanzhai um sentido de transformação. Em “Shanzhai: desconstrução em chinês”, o filósofo sul-coreano Byung-Chul Han, apresenta esse pensamento como “des-criação”, como algo que reivindica a diferença transformadora, o diferir ativo, ativista, frente ao ser, o processo, frente à essência, o caminho. Shanzhai, para Han, operaria portanto cima uma hibridização intensiva, atravessando as camadas dos valores estéticos, éticos e até mesmo políticos.


Mello também para colaborar com a construção de sua abordagem a medicina oriental como noção para pensar a ideia de extremidades. O termo para Mello diz respeito a uma termo metafórico derivado dos métodos terapêuticos da medicina oriental como a acupuntura, reflexologia e o do-in. Sendo assim, relaciona esse campo da medicina que lida com a capacidade de pontos cutâneos extremos, que ao serem ativados interconnectam os elementos de um mesmo organismo, com o processo de descentralização do corpo como linguagem, onde o vídeo é posto como organismo complexo para análise. É diante do pensamento de Mello que as telas, hoje em dia a extensão do nosso corpo com os aparelhos celulares, podem ser consideradas pontos extremos de interconexão e ampliação das possibilidades de pensar linguagens e imagens.

Aplicada à obra If you’re lucky (bad copy lost in translation), essa abordagem não apenas revela seus aspectos formais, mas a posiciona como um artefato em fricção com os modelos dominantes de circulação e legitimação da imagem. Trata-se de uma obra que não busca purismo, mas atravessamento; que não recusa o ruído, mas o inscreve como linguagem; que não propõe uma unidade, mas uma zona de negociações.

O deslocamento do campo observacional já é, por si, um gesto de extremidade. A residência artística acontece em Dafen, um bairro periférico de Shenzhen, cidade da China continental conhecida pelo dinamismo industrial e pela inovação tecnológica. No entanto, no campo simbólico das artes visuais, Dafen não ocupa o centro: ele representa um “lugar incomum”, um território marcado pela prática da cópia, pela produção serial de imagens e por uma economia cultural que escapa às lógicas ocidentais de consagração artística.


Essa posição periférica e tensionada em relação ao sistema global das artes torna-se, nesta análise, uma zona fértil de escuta e reorganização. É nesse entre-lugar que se manifesta a filosofia shanzhai, não apenas como prática de falsificação ou improviso, mas como pensamento que combate frontalmente os pilares do pensamento ocidental: a valorização do original, da autenticidade, da autoria individual e da permanência. O shanzhai opera como estética da variação, da transformação constante e da repetição criativa. Ao inserir-se nesse contexto, a artista mobiliza não apenas uma geografia distinta, mas uma lógica cultural que questiona diretamente os valores dominantes no campo da arte.


Essas aproximações não devem ser lidas como equivalência, mas como ressonâncias. Tanto a abordagem das extremidades quanto o pensamento shanzhai convocam uma reorganização das formas de ver, pensar e operar na arte. Elas desconstroem a centralidade do autor, a fixidez do signo e a transparência da linguagem. Elas partem da margem para entender o sistema, e não do centro para definir a periferia. Ao reunir essas duas perspectivas em uma só obra – If you’re lucky (bad copy lost in translation) – a artista propõe um pensamento por aproximação, acúmulo econtaminação, onde a imagem se desloca sem cessar, e os critérios de valor e sentido estão em aberto.


A Abordagem das Extremidades, nesse sentido, permite perceber como o deslocamento para um território não-hegemônico ativa novas escutas e reorganiza a percepção da prática artística. O trabalho emerge da fricção entre mundos e valores — entre a pintura e o algoritmo, entre a aura da obra e sua fragmentação, entre o sistema da arte institucional e a prática cotidiana da reprodução visual. A obra não observa Dafen de fora: ela se contamina por ele.

2.1. Desconstrução: o colapso da pintura como forma estável

A desconstrução na obra se dá, primeiramente, na recusa em manter a pintura no lugar seguro de uma linguagem autônoma e tradicional. Ao utilizar etiquetas adesivas como suporte pictórico, a obra desarma as convenções associadas ao quadro, à moldura, ao cubo branco. A superfície da pintura, que antes seria nobre e única, é transposta para um objeto cotidiano, descartável, colável, reconfigurável. Nesse gesto, não apenas o suporte é desconstruído, mas também a ideia de permanência, fixidez e unicidade da imagem. A pintura deixa de ser “quadro” para tornar-se gesto distribuível, imagem reconfigurada, peça móvel.


Outro aspecto da desconstrução é a instabilidade semântica que a obra propõe. A imagem original, seja ela criada por IA ou por pintura manual, é sempre reapresentada sob algum grau de transformação. A numeração das unidades não funciona como certificado de exclusividade, mas como índice da multiplicação. A distribuição aleatória por sorteio desconstrói também o sistema de valoração estética: o público não escolhe com base no gosto, na cor ou na técnica, mas recebe o que a sorte lhe entrega. Há, nesse processo, uma desautorização dos critérios hegemônicos de avaliação artística e uma subversão sutil dos códigos do colecionismo e da fruição institucional.

Essa desconstrução é, portanto, plástica e semiótica: ela atinge tanto o objeto quanto a experiência, tanto o suporte quanto o gesto de recepção. A pintura, como linguagem, é levada ao seu limite para poder se reconfigurar em novos termos — não mais como obra-autônoma, mas como partícula em trânsito.

2.2. Contaminação: entre o pictórico, o digital e o cotidiano

A contaminação na obra aparece como vetor estruturante. Desde o título — que une inglês coloquial, trocadilho crítico e ironia interlinguística — até a materialidade das imagens, a obra é um campo de fricção entre registros diversos. A pintura feita à mão contamina-se com o erro digital da IA; a inteligência artificial, por sua vez, se contamina com a linguagem pictórica que a artista reinscreve em outro suporte; os stickers, em seu turno, contaminam-se com a lógica do souvenir, do objeto gráfico, do presente kitsch.


Essa contaminação se dá também entre estéticas e sistemas culturais distintos: a artista brasileira insere-se em um território chinês, operando no interior de um sistema de produção visual marcado por outra lógica de cópia e repetição. A experiência de Dafen não é apenas observada; ela é atravessada pela artista e devolvida em forma de arte contaminada: por culturas, por línguas, por gestos e tecnologias.


Na abordagem das extremidades, contaminação não é mistura ingênua. É um procedimento que evidencia a instabilidade dos códigos, a hibridização das linguagens e a irreparável tensão entre regimes culturais. A contaminação que se vê na obra não apazigua as diferenças entre Oriente e Ocidente, entre arte e objeto, entre pintura e sticker, ao contrário, as explicita, as carrega, as deixa sem resolução.


A própria operação de trabalhar com imagens geradas por IA, ao lado da pintura gestual, evidencia essa tensão. Não se trata de afirmar a superioridade de uma linguagem sobre a outra, mas de colocar ambas em confronto, revelando seus limites e excessos. A pintura se contamina com o digital; o digital se contamina com o pictórico; e ambos se contaminam com o acaso da escolha, com o gesto do público, com o deslocamento da obra para o mundo.

2.3. Compartilhamento: imagem como circulação e gesto

O procedimento de compartilhamento aparece na obra de forma múltipla. Em primeiro lugar, o sorteio de stickers transforma o público em portador da obra. Cada pessoa que recebe uma etiqueta carrega consigo uma parte do trabalho, podendo colá-la onde quiser, postá-la,esquecê-la, protegê-la. A obra, assim, escapa do espaço expositivo e prolifera. Esse gesto rompe com a lógica da contemplação e introduz o trabalho em circuitos imprevisíveis: afetivos, domésticos, digitais.


Christine Mello propõe o compartilhamento como um operador ético-estético que se opõe à ideia de obra fechada. Na obra de Milaré, o compartilhamento não é só distribuição: ele é também uma proposta de reconfiguração da imagem no corpo social. Os stickers tornam-se agentes móveis que desconstroem a estabilidade da obra e contaminam o cotidiano. O gesto do público – colar, postar, circular – participa da constituição da obra como campo expandido.


Há, nesse sentido, um compartilhamento de agência: a artista abre mão do controle absoluto da imagem; o público não é apenas receptor, mas coparticipante do gesto artístico. A imagem performa, não porque se move por si mesma, mas porque move os outros. Compartilhamento, aqui, não é apenas técnica ou formato; é uma proposta política de circulação do sensível.

3.IMAGEM PERFORMATIVA: entre o pictórico, o digital e o shanzhai

A imagem contemporânea não se define mais apenas por sua visibilidade ou composição formal. Segundo César Baio, é preciso considerar a imagem a partir de seu comportamento, de seu modo de agir no mundo, de sua capacidade de instaurar relações e presenças. Essa perspectiva conduz à formulação do conceito de imagem performativa, que o autor propõe a partir de referências como Vilém Flusser e Arlindo Machado, mas também em fricção com práticas artísticas que desafiam o estatuto tradicional da representação.


Na imagem performativa, não se trata de “mostrar algo” ou “comunicar uma mensagem”, mas de produzir um acontecimento. A imagem deixa de ser uma janela para o mundo e passa a ser um agente que atua, se modifica, convoca, desloca. Ela não se fixa no visível, mas se realiza em uma experiência situada e em constante reformulação. A performatividade, nesse caso, não diz respeito apenas à imagem que se move ou que interage, mas àquela que, em sua existência relacional, cria sentido ao agir sobre o outro e com o outro.


É nesse campo que se insere a obra If you’re lucky (bad copy lost in translation). A começar pela sua materialidade instável: o gesto pictórico, normalmente associado à presença do artista, é aqui deslocado para suportes inusuais, como etiquetas adesivas. As imagens ali presentes têm origem num processo algorítmico de inteligência artificial, que entrega à artista figuras que não são completamente reconhecíveis, nem plenamente definidas. Essas imagens, por sua vez, são retomadas no plano da pintura, mas uma pintura que não afirma autoridade, virtuosismo ou controle, e sim um gesto de reinscrição, de fricção entre o manual e o automatizado.


A relação entre imagem pictórica e imagem digital na obra não é de oposição, mas de interferência. As camadas se misturam: a imagem gerada digitalmente é pintada, impressa, fotografada, sorteada, colada, compartilhada. Cada uma dessas etapas modifica a imagem, ativa novos sentidos e desloca sua condição. A imagem não está “pronta”: ela está sempre em trânsito. Sua existência está no gesto, no uso, no contexto. Como propõe Baio, a performatividade da imagem se realiza quando ela deixa de ser um objeto representacional e passa a ser um campo de co-presença.

O sorteio das etiquetas, nesse sentido, não é apenas uma estratégia de mediação: é um dispositivo de ativação da performatividade. O público não contempla a imagem; ele a recebe, a manuseia, a carrega consigo. Cada sticker entregue gera uma nova situação de imagem — uma nova cena de circulação, de presença, de gesto. A obra não se encerra na exposição: ela se espraia, se desloca, se reinventa. Ela é, em si, uma imagem que performa, não porque se move fisicamente, mas porque cria situações de relação.


É nesse ponto que a proposta de Baio pode ser colocada em diálogo com o pensamento shanzhai, que atravessa a pesquisa de Milaré. Ao contrário da lógica ocidental, que entende a repetição como perda, a tradição shanzhai afirma a transformação contínua como modo de existência. Nesse modelo, a cópia não é um simulacro, mas uma performatividade da diferença: a cada repetição, algo se transforma, e é nessa transformação que reside o valor.


Essa lógica se aproxima da imagem performativa, pois ambas recusam a ideia de identidade fixa, de significado essencial, de autoria estável. Tanto na imagem performativa quanto no shanzhai, o sentido emerge no ato, na situação, no gesto em relação com o outro. Ambas trabalham com os limites da representação, com a falha como potência e com a instabilidade como condição estética e política.


Assim, a obra If you’re lucky pode ser lida como um território onde a performatividade da imagem e o pensamento shanzhai se encontram: não como conceitos unificados, mas como forças que se contaminam. A imagem gerada por IA, pintada, sorteada e compartilhada não tem origem única nem destino final. Sua existência se dá na repetição com diferença, na sobreposição de camadas, na imperfeição do gesto, na banalidade do suporte. Ela performa porque convoca o outro a agir com ela, e shanzhai porque nasce da cópia como diferença, da tradução como traição, do erro como motor.


A hipótese que se insinua, portanto, é que o pensamento shanzhai pode ser compreendido como um regime de performatividade: um modo de fazer e pensar imagens que não se apoia na fixidez, mas na variação; que não busca o original, mas o entre; que não visa à pureza, mas à circulação. Ao colocar esses dois conceitos em fricção, performatividade da imagem e filosofia shanzhai, o artigo propõe uma nova leitura da obra e da própria condição da imagem contemporânea, em que a pintura já não é apenas matéria, nem a tecnologia apenas meio: ambas se tornam zonas de ativação de presença e crítica.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A obra If you’re lucky (bad copy lost in translation), de Júlia Milaré, situa-se em um território onde os limites entre pintura, cópia, tecnologia, linguagem e circulação se tornam porosos. Ao articular pintura manual, imagem digital, inteligência artificial e dispositivos de distribuição como etiquetas adesivas, o trabalho instaura uma zona de tensão em que o gesto pictórico é atravessado por automatismos, e a ideia de original é dissolvida em procedimentos de variação e reenvio. Não se trata apenas de um comentário sobre a circulação de imagens na contemporaneidade, mas da formulação de um gesto que ativa e reconfigura os modos de produção e percepção da imagem.


Nesse percurso, a obra revelou-se particularmente fecunda para o diálogo entre diferentes concepções críticas e epistemológicas. Através da abordagem das extremidades, proposta por Christine Mello, foi possível reconhecer na obra os procedimentos de desconstrução, contaminação e compartilhamento, que operam não apenas no plano formal, mas nas decisões éticas e políticas do trabalho. A pintura deixa de ser território seguro da autoria para tornar-se superfície móvel, instável, em trânsito. A imagem, por sua vez, já não é mais entendida como representação de algo, mas como dispositivo de relação, ato de presença, ato de fala.


Ao aproximar a obra da noção de imagem performativa, tal como desenvolvida por César Baio, a leitura desloca-se do campo da representação para o campo da experiência situada, em que a imagem atua ao instaurar encontros, fricções e contextos. A obra não representa um conteúdo, ela age: age ao ser copiada, sorteada, colada, compartilhada; age ao produzir instabilidade entre o pictórico e o digital; age ao não oferecer um ponto fixo de sentido. Essa performatividade da imagem, que envolve os espectadores como participantes do gesto, desestabiliza os sistemas tradicionais de produção de sentido, valor e autoria na arte.


Nesse sentido, a hipótese colocada ao longo do texto é que o pensamento shanzhai pode ser entendido como um modo de performatividade: torna-se um ponto de inflexão. O shanzhai não apenas desafia as lógicas ocidentais de originalidade e autenticidade, mas propõe uma ontologia da diferença: uma lógica em que o valor da imagem está em sua capacidade de se transformar, de escapar à identidade, de fazer do erro um recurso. Essa filosofia, enraizada em tradições culturais orientais, aproxima-se tanto da abordagem das extremidades quanto da performatividade da imagem ao propor formas outras de pensar o gesto, a linguagem, a circulação e o sensível.

Ao inscrever-se nesse cruzamento entre pintura e tecnologia, tradição e desvio, cópia e criação, a obra If you’re lucky não apenas reflete um estado da arte contemporânea — ela intervém nesse estado, atua sobre ele, desloca seus parâmetros. Não se trata de uma obra sobre o digital, ou sobre a cópia, mas de uma obra que se faz nesses campos: que acontece entre eles. Por isso, ela escapa de classificações estanques e convida à experimentação crítica, tanto em seu gesto artístico quanto na sua recepção.

Dessa forma, o artigo buscou não apenas apresentar uma leitura da obra, mas experimentar, por meio dela, modos de pensar com imagens — e não apenas sobre elas. Ao reunir operadores como extremidades, performatividade e shanzhai, propôs-se uma articulação conceitual que desloca o olhar do objeto para o acontecimento, do suporte para o gesto, do sentido para a relação. É nesse deslocamento — ou melhor, nessa entrezona — que a imagem contemporânea revela sua potência crítica e inventiva

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS


BAIO, César. Máquinas de imagem: arte, tecnologia e pós-virtualidade. São Paulo: Annablume,
2015.


HAN, Byung-Chul. Shanzhai: desconstrução em chinês. Petrópolis, RJ: Vozes, 2023.


MELLO, Christine. Extremidades do vídeo. São Paulo, SP: Editora Senac, 2008.


QUARANTA, Domenico. Digital Kitsch. In: RYYNANEN, Max; BARRAGÁN, Paco (Org.).
The Changing Meaning of Kitsch. Helsinki: Aalto ARTS Books, 2023.