ATO 2: VAI PASSAR – INSTALAÇÃO 2022

Durante a última etapa do ATO 3 da Residência-Artes Vai Passar Online (2021) surge o convite para participar com a instalação Vai Passar (2019) de uma exposição no Centro Cultural dos Correios a Diálogos de Corpo e Alma, organizada por Lesiane Lazzarotti Ogg e com curadoria de Luiz Badia. Com esse convite repensei o meu próprio trabalho e não vi mais sentido em estar nessa exposição com apenas meu trabalho individual. Atravessada com a experiência coletiva construída durante a Residência-Arte Online proponho a participação das residentes junto comigo na estrutura de minhas passagens, surgindo assim a instalação Residência-arte | Vai Passar na Exposição Diálogos de Corpo e Alma.

Vai Passar – uma residência em processo, 2022, Malka Borenstein. Imagem: Anna Bueno.

Com a experiência e com o desejo de pertencimento, de fazer parte, trabalhado na residência, desenvolvo uma estrutura pensando no habitar, No compartilhamento de saberes artísticos e fazer parte de um grupo por afinidades semelhantes, por afetos contaminados e construção de redes era o conceito que seria desenvolvido naquela instalação. 

Quando começamos a orçar a estrutura, nos confrontamos com as dificuldades orçamentárias para dar continuidade ao projeto, pois tanto a exposição, quanto a instalação não estavam inscritas em nenhum edital ou um programa de fomento financeiro. Mas com o desejo de materializar em trabalhos, processos que foram desenvolvidos durante a residência, começamos a pensar em possibilidade para a sua realização. A solução encontrada foi de realizar uma troca do material necessário para construção da estrutura da instalação por mão de obra Dessa proposta surgiu a parceria com uma outra artista mulher e sua equipe, que tiveram como contrapartida, para participar da construção e montagem da instalação, o valor para o material, que no final da exposição tais materiais ficaria para o seu projeto artístico pessoal. Nessa parceria eu e as curadoras do coletivo MEIOAMEIO ficamos abertas também para sugestões arquitetônicas para a construção da instalação onde foi pensada a Vai Passar como uma planta baixa de uma casa, com as obras apresentadas preenchendo o que seriam seus cômodos.

Residência-arte | Vai Passar – uma residência em processo

Texto curatorial MEIOAMEIO

Atenção ao processo, essa é a chamada da Residência-arte | Vai passar. O direcionamento conceitual para a realização da instalação Residência-arte | Vai Passar na Exposição Diálogos de Corpo e Alma, se constrói a partir de um espaço de experimentação baseado no compartilhamento como método disparador de criação. O trabalho inicial tinha uma forma linear e se concretizou em uma instalação interativa, idealizada por Malka Borenstein. Agora o mesmo se desdobra na obra intitulada Vai Passar, que se constitui a partir de espaços de passagem, onde o visitante da instalação é convidado a permear os mesmos como se estivesse adentrando em uma casa, habitando o espaço e despertando o corpo. Essa  estrutura contém seis passagens de diferentes materiais onde o espectador pode entrar, sair, ocupar, passar e até mesmo, se desejar, habitar.

 A instalação Vai Passar dará vida a uma estrutura expandida que recebe as obras de quatro artistas residentes e seus processos compartilhados durante a Residência-arte | Vai Passar – ATO 4 que aconteceu online para mulheres em 2021.

As artistas Fernanda Bittencourt, Isabelle Passos, Heloisa Franco e Karola Braga, nessa exposição, compartilham o processo proposto por Malka Borenstein da criação de uma nova lógica organizacional para a feitura de uma residência-arte, constituída por e para artistas, que defende a ideia da residência como um sistema híbrido produtor de uma nova linguagem.

Fernanda Bittencourt traz em duas fotografias olhares que retratam em paralelo a forma como a artista se vê reconhecida pela sociedade – ao se questionar e ser questionada – sobre sua pele, em contrapartida com os padrões sociais pré-estabelecidos. Para tal Bittencourt é disparada e pretende dar destaque em sua obra para a questão pessoal por trás da palavra Exótica – palavra que dá nome ao trabalho –  questionando se o fato de não ser uma pessoa considerada padrão, faz com que ela seja exótica, questões essas, disparadas por ela em todo o processo da residência-arte.

Em contra partida, Isabelle Passos ao invés do olhar do outro, internaliza seu olhar para si mesma, à medida que traz em seu âmago questões relacionadas à intimidade e autofagia da própria artista. Durante o seu processo na residência trabalhou questões relacionadas ao autoconhecimento, a partir de uma questão interna, do seu próprio corpo. Essa experiência tornou-se motor para suas criações de desenhos durante a residência-arte.

Heloisa Franco, mantém uma linha estética complementarmente oposta a das citadas anteriormente. Franco, trabalha sua obra com processos de expurgo de sentimentos através dos materiais e técnicas escolhidas para sua produção, traz em seu fazer um desabafo, cria uma ação do corpo com a tela, com gestuais de aplicação e retirada dos materiais. Em um de seus momentos de criação tomada pela emoção, Franco desloca sua ação estética para a própria criação, rasga sua obra, e traz para a exposição sua tela em fragmentos. Tal fato potencializa a obra abstrata e reforça as pautas discutidas pela artista durante a vivência na residência.

Karola Braga, constrói uma obra de modo a retratar e relatar suas inquietudes durante o momento vivido no processo de residência. Karola traz para a exposição uma composição de uma fotografia composta por suas percepções sensoriais de relacionamentos, términos, lutos e transformações ao longo da pandemia de COVID-19, que aconteceu em paralelo com a residência e contaminou todos os processos. A imagem contará com um elemento essencial da obra de Braga, que trabalha com obras olfativas, e trará à tona tanto os processos de internalização da artista quanto o processo de amadurecimento e racionalização de sentimentos em um período de isolamento, à medida que expõe e contamina os visitantes com uma memória olfativa.

A instalação apresentará também um depoimento sonoro de Ilana Mountian, Psicanalista convidada que esteve presente em todos os encontros, e fará parte do corpo da instalação que contará com fragmentos de registros e depoimentos ressignificados para a exposição, para ilustrar de forma prática como foi a construção do processo de uma residência-arte.

A curadoria deste processo conta com o acompanhamento do coletivo curatorial MEIOAMEIO, composto pela artista Fernanda Oliveira e pela curadora Paula Squaiella. O esforço da curadoria para a instalação Residência-arte | Vai Passar na Exposição Diálogos de Corpo e Alma foi o de construir o diálogo com os processos das residentes deslocados para o espaço expositivo, através de uma narrativa processual construída a partir da articulação das camadas de subjetividade, um trabalho coletivo por parte das curadoras junto às residentes e seus objetos de estudo.

 A curadoria fundamentou sua criação ao encarar uma residência como um organismo complexo, com um sistema coordenado por circunstâncias que se relacionam entre si. Neste sentido, o processo curatorial se apresenta como não sendo uma simples questão de crítica ou escolha expográfica, e sim como um devir poético. Parte da premissa de um processo criativo, um estudo de como as obras e residentes se relacionam em um espaço, onde o tempo e o processo são núcleos de experiências, narrativas e estéticas. Entende-se aqui por devir poético um estar em relação, onde o ato curatorial não aconteceria, sem que esse se deste junto aos atravessamentos conceituais e teóricos com os objetos de interesse das artistas ao longo de todo o acompanhamento da Residência-arte | Vai Passar – ATO 4 | Online para Mulheres (2021).