Publicações/ Extremidades do Vídeo
“O vídeo é como um campo de conhecimento no qual o pensamento contemporâneo se sintoniza”. Segundo Christine Mello, o vídeo está presente em várias dimensões do cotidiano e possui profunda sinergia com os distintos modos de produção audiovisual, como a internet e a telefonia móvel, as experiências e instalações das artes visuais, os espetáculos eletrônicos dos VJs; e linguagens como a da interatividade, da hipermídia, da realidade virtual, do videogame e da inteligência artificial. Ou seja, o vídeo transcendeu suas funções originais e passou a ter uma nova abrangência como ligação midiática entre diversos pensamentos, práticas e formas de produção artística.
Mais do que procurar a “especificidade do vídeo”, o seu traço distintivo, a autora partiu da análise de suas “extremidades”, isto é, de seus pontos de expansão com outras formas de criatividade, para entende-lo em toda sua heterogeneidade e alcance. O resultado é um amplo levantamento da produção videográfica brasileira, desde seus primórdios até a produção atual do século XXI, no qual o vídeo é visto não isoladamente, mas inserido num contexto maior, ampliando as discussões do campo da arte.
Este livro é um presente. Ou melhor, arriscando os usos perigosos de determinadas palavras: é um privilégio, de um tipo não excludente (se isso é mesmo possível), tê-lo entre nós. Como nos sugere Arlindo Machado em sua apresentação, está obra constitui um privilégio, para os brasileiros, por proporcionar contato com uma fértil produção em artes eletrônicas da forma como é pensada, mapeada e analisada criticamente por Christine Mello. Concordo.
A abrangência da pesquisa que originou Extremidades do vídeo não está apenas contida no título. Ela é resultado tanto de mergulhos profundos como de uma atenção às “emersões” e superfícies, em distanciamentos necessários. Christine foi atuante em momentos de embate e cruzamento do vídeo com muitas de suas mídias vizinhas, circundante do cinema, da arte contemporânea e principalmente do “entre” uma coisa e outra, acompanhou de perto o trabalho de muitos que se debateram com o estranhamento diante do novo, com o desafio de encarar linguagens em formação. Ajudou a cunhar conceitos; faz ecoar pensamentos embutidos em imagens e tem sido voz essencial em torno das possibilidades expandidas do vídeo.
Assim, constitui também um privilégio estar entre os contemplados pelo rigor de sua análise, com realizadores marcantes no cenário não exatamente de uma “videoarte”, mas de uma arte desgarrada e múltipla, que se inquieta diante de desafios e instabilidades ligadas a tecnologias, que enfrenta o contexto permeado pelo eletrônico-digital, que observa os deslocamentos na sociedade em rede, que opera construções e desconstruções de sintaxes, que compartilha e circula por ligações perigosas entre veículos, meios e mídias – o medium como mensagem, talvez, mas em constante transformação.
Divido com os mais de cem colegas “estudados”, observados ou mencionados neste livro, a sensação de estar sob olhos em constante atenção. Nesse caso específico, menos um fator de constrangimento e muito mais um motivo de conforto. A pesquisa persistente de Christine nos guia por oportunidades de melhor compreensão, de encontro com outros públicos e olhares.
Os estudos se tornaram livro, e passamos agora de mão em mão. E nos imaginamos assim sob o olhar crítico e curioso do leitor. Os cuidados e rigores da autora nos deixaram mal-acostumados, esperamos estar mais uma vez em boas mãos.”
Lucas Bambozzi
artista multimídia